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terça-feira, 8 de outubro de 2013

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Brasil-EUA, hora da verdade

Rubens Barbosa* - O Estado de S.Paulo
Aconteceu de eu estar em Washington, liderando uma delegação empresarial da seção brasileira do Conselho Empresarial Brasil-EUA, no dia em que os presidentes dos dois países decidiram anunciar o adiamento da visita de Estado de Dilma Rousseff, prevista para este mês. Apesar da surpresa e do desapontamento manifestados por todos os funcionários norte-americanos dos diversos ministérios e da Casa Branca com quem conversamos, parece não haver dúvida de que o adiamento foi a melhor solução para evitar maiores constrangimentos aos dois presidentes. Não se podia ignorar o risco de que, enquanto a presidente brasileira estivesse na Casa Branca, fossem divulgadas novas informações sigilosas do governo do Brasil.
A decisão final do governo brasileiro evitou o radicalismo proposto pelo PT, que, além do cancelamento da visita, queria a retirada do embaixador em Washington e a expulsão de elementos da NSA e da CIA lotados na Embaixada dos EUA em Brasília. Certamente as autoridades norte-americanas sabem que a campanha presidencial de 2014 já começou e que no Brasil, como em muitos outros países, uma atitude antiamericana sempre rende votos.
A decisão de adiamento foi menos uma bravata confrontacionista e mais uma reação natural a práticas ilegais de interceptação de comunicações e dados de cidadãos, empresas e membros do governo, temperada por considerações de ordem política doméstica. Ninguém é ingênuo para pensar que os EUA estejam sozinhos na prática de espionagem, ao contrário, mas não se podia minimizar o ocorrido. Como escreveu conhecido escritor e político britânico, há um 12.º mandamento a ser respeitado: não deverás ser descoberto...
Sem dúvida, dados a importância e o simbolismo das visitas de Estado na liturgia do poder nos EUA, deverá haver repercussões de curto prazo no relacionamento bilateral. O pronunciamento da presidente Dilma nas Nações Unidas não terá ajudado a diminuir o impacto negativo. Pode-se esperar um retrocesso temporário nos acordos e entendimentos em andamento. E não me surpreenderia se uma orientação de nível mais alto tiver determinado a desaceleração e a revisão do relacionamento com o Brasil. O que fará o governo brasileiro caso o pedido público de desculpas dos EUA e as explicações satisfatórias não venham? Como ficarão as relações entre os dois países?
O adiamento da visita reflete também a baixa prioridade política e diplomática que os dois países atribuem hoje à sua relação bilateral. Do lado do Brasil, nos últimos 12 anos, por considerações ideológicas e partidárias, as prioridades são as relações Sul-Sul, com destaque para a América do Sul, a África e o Brics. Da parte dos EUA, em razão da ausência de ameaças à segurança nacional e de seu foco estar voltado para a China e para o Oriente Médio, a América do Sul e o Brasil estão fora dos radares dos formuladores de política de Washington.
Talvez o episódio gerado pela revelação da espionagem possa transformar-se num elemento positivo para uma eventual mudança nesse quadro.
A dar crédito ao que ambos os governos registraram nas respectivas notas em que anunciaram o adiamento da visita, a relevância e a diversidade das relações bilaterais são de interesse recíproco. Assim, a retomada dos entendimentos oficiais poderia ser uma oportunidade para se encontrar um novo enfoque para a relação bilateral, deixando de lado os radicais de ambos os lados.
Numa perspectiva de médio e de longo prazos, parece ser de nosso interesse a ampliação da relação, num ambiente de respeito mútuo e de confiança restaurada. O problema é saber como conectar interesses concretos do governo e do setor privado de forma a criar uma base e um ambiente que não permitam situações como a que foi agora criada. Brasil e EUA devem superar os estereótipos e preconceitos recíprocos e têm de definir o que desejam da relação com o outro.
De forma pragmática, Washington e Brasília deveriam dar um tratamento de choque na relação entre os dois países. Novas ideias - e não apenas os assuntos rotineiros que há anos frequentam a agenda dos dois governos - deveriam ser trabalhadas. E o setor privado deveria ter papel relevante nesse sentido. Gostem ou não os que aqui se opõem a um relacionamento mais estreito entre os dois países, o reconhecimento para o Brasil se sentar à mesa principal dos fóruns mundiais de decisão passa não só pela crescente projeção externa do País, mas, sobretudo, pela boa relação com e pela percepção positiva de alguns dos países, que estão no centro de poder global, liderados pelos EUA.
No início de seu governo o presidente Barack Obama declarou que o México e o Brasil deveriam ser tratados de forma diferenciada. Não sei se agora o governo americano ainda está interessado nisso. Em caso positivo, poderia estender ao Brasil o mesmo tratamento dispensado à Índia, à Coreia do Sul e à Turquia. Nestes casos prevaleceram evidentes considerações de natureza estratégica e militar. A motivação no caso do Brasil seria o interesse dos EUA em incrementar uma efetiva parceria com o nosso país nas áreas de comércio e investimento, sobretudo em setores sensíveis, como inovação, defesa, espaço e nuclear. Nessas áreas o Brasil, para não continuar fora desse mercado por restrições e controles à exportação de produtos, serviços e tecnologia de uso dual, poderia ser incluído na lista de países que se beneficiam de isenções de licenças de exportação (Strategic Trade Authorization) ou que negociaram acordos de cooperação.
Como ocorreu com países europeus e com a Índia e o México, também afetados pela espionagem dos EUA, espera-se que o Brasil dê prioridade, na relação com Washington, aos interesses nacionais permanentes sobre os objetivos ideológicos e partidários de curto prazo.
*Rubens Barbosa é presidente do Conselho de Comércio Exterior da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP).
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